Esquecida Aldeia, Esquecida Vida

11:01

A chuva ampara-se sobre a calçada de uma aldeia esquecida à beira-mar, Porto Covo, ou outra qualquer onde ninguém dá a sua importância. As nuvens cobrem os céus e cá do cimo da aldeia, junto da igreja, ouvem-se as ondas do mar rebentar contra os rochedos. Furiosas, desejando a tempestade. 

Mas, de certo modo, a tempestade já está presente, as gaivotas pousam delinquentemente em todos os lugares, sujando, danificando, mostrando que esta terra lhes pertence. Os homens, de tão poucos que são, mantêm-se por baixo daquelas asas e deixam-se ser carregados pelos dias, como um rio sendo levado até ao oceano.

Esquecem-se de viver e preocupam-se em demasia com tudo aquilo que têm mas ainda mais com aquilo que, amanhã, poderão não ter. O pão e o vinho é mais suficiente que o agora, o estômago e a saúde é a satisfação que os eleva de dia para dia. Em certos casos escondem-se ao que lhes proporciona sorrisos e alegrias. A idade já lhes pesa e a pequena aldeia piscatória já só encontra tempestades.

Com ventos e agonias lamentam-se das rugas e das más recordações, lastimam não viver mas também não tentam fugir à rotina com medo de falhar. As mãos pouco agarram e os olhos pouco vêm. Os dias são levados com aquela pacata respiração sem emoção. Só resta a dor naquelas casas caiadas de branco de faixas azuis. O som, levemente se apaga e nem o vento toca nas altas palmeiras. É demasiada a calma, demasiado silêncio para aqueles corpos que ainda emanam vida e sonhos. 

Que sejam elevados da cadeira de madeira, que ergam a vontade de viver como quem ergue a cana de pesca e se prepara para apanhar o maior peixe que alguma vez pensara pescar. Que demonstrem saber sorrir e quando a vida se lembrar de trazer tempestades, lembre-nos que as colheitas só crescem com água, que os campos floridos são mais bonitos e que debaixo da chuva também se dança. 

A vida não é uma aldeia debaixo de tempestades até que nos esqueçamos, realmente, de como bom é viver.


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21 comentários

  1. Que texto bonito. Lembra-me a minha aldeia há uns anos atrás... agora está mais movimentada

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  2. Gosto de Porto Covo, terra desvendada por Rui Veloso :D

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  3. Linda semana!!!!!!!!!! Abraços

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  4. Porto Covo, gosto tanto :)
    Conheces tbm S.Torpes?

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  5. Há locais que vão ficando esquecidos e isso é uma pena, até porque, muitos deles, são donos de encantos ímpares *.*
    Adorei, como sempre!

    r: Muito obrigada <3

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  6. Gosto de ir para a Costa nesta altura. Vou para casa de amigos, para perto da lareira, e assim se passam as horas. Tão bom.

    Ahhh...Está a decorrer no meu berloque a votação do politico mais giro!

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  7. Olá Paulo,

    Em primeiro lugar, obrigada pela visita, que me proporcionou a oportunidade de conhecer o seu espaço.
    Além desta, li também as suas duas crônicas anteriores. Fiquei encantada com a sua escrita.
    O ser humano precisa aprender a valorizar os seus dias, os seus sonhos e a sua vida. São as emoções sentidas e vividas que medem a intensidade da nossa vida.
    "As mãos pouco agarram e os olhos pouco veem". Esta colocação contém segredos da arte de bem viver.
    "E que debaixo da chuva também se dança". Que não nos esqueçamos disso!

    Linda e reflexiva crônica. Adorei ler.

    Abraço.

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  8. r: Consigo ser mesmo mázinha :p ahah gostas, gostas!

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  9. Bom texto. Esse texto fez me rever a minha aldeia com poucos habitantes, onde por recantos se encontra os senhores nas esplanadas com o seu belo copo a falar da vida e a contar as suas histórias que passam 'pelas memorias. adoro visitar aldeias.
    Gosto da foto.
    http://retromaggie.blogspot.pt/

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  10. Comovente relato, lindo. Ricamente detalhado, minusculamente descrito, uma delicia de leitura, que nos remete as coisas simples, a vida pacata longe das grandes cidades, inalteradas, congelada, com preguiça de passar, de perder a pureza e o encantamento. Abraços.

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  11. Belo texto, como é bom poder voltar aqui e lê com calma, na correria dos estudos precisei me ausentar um pouco dessas leituras que amo.
    Amei o texto, que nós humanos possamos ver mais além de fatos simples do cotidiano, pois esses lapidam nosso futuro melhor do que nossos próprios planos.
    Abraços, muito bom de reler!

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  12. r: Oh *.* ganhei o dia ao ler o que comentaste. Obrigada <3

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  13. OI PAULO!
    INSPIRAÇÃO DAS MELHORES QUE JÁ TE FORAM DITADAS PELA ALMA, AMIGO.
    ABRÇS
    http://zilanicelia.blogspot.com.br/

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  14. Já estive em Porto Côvo algumas vezes e se há coisa que eu gostaria de ver era aquela aldeia cheia de vida! É um local tão bonito :)

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  15. "Os dias são levados com aquela pacata respiração sem emoção".
    Um excelente texto, gostei imenso.
    Paulo, tem um boa semana.
    Abraço.

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  16. Belíssima texto sobre um dos inspiradores locais do meu Alentejo.
    Gostei muito. E da foto, com tanta simplicidade e pacatez, também!
    Obrigada pela visita e comentário no meu blog.
    xx

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  17. Haverá sempre um lugar que represente isso. O sentimento puro da saudade.

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  18. Um texto fantástico e agradável de se ler.

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  19. Viajei até à simplicidade das coisas que tantas vezes se perdem no tempo,mas no entanto, nao se perdem com o tempo... Lindo texto.

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